Pieces of a Woman (2020)
Quando um parto natural em casa corre de maneira trágica,
a mãe, que perde a sua filha atravessa um longo ano de luto, passando por
diferentes fazes e problemas. Desde problemas físicos até problemas familiares,
Martha é confrontada com a dor do luto e de incompreensão.
Pieces of a Woman é um filme forte emocionalmente e é
facilmente relacionado com muitas mulheres que passaram pela mesma luta. Realizado
por Kornél Mundruczó e com argumento escrito por Kata Wéber, este é um filme
distribuído pela Netflix. Tem como produtor um nome já galardoado no mundo do
cinema, Martin Scorsese, e é produzido por Bron Studios, Little Lamb
Productions e Creative Wealth Media Finance.
Com um elenco de nomes já conhecidos Pieces of a Woman
é um filme que promete dar que falar e que infelizmente parece ter passado ao
lado de muitas pessoas. Está apenas nomeado para um dos prémios dos Oscars de
2021, sendo que é para o de melhor atriz com Vanessa Kirby, mas também não
consigo ver onde mais poderia ser nomeado, visto a qualidade da concorrência.
Mas não é só a atriz do The Crown que brilha no filme, este também conta
com Shia LaBeouf (que interpreta Sean, o marido de Martha), Ellen Burstyn
(interpreta a mãe), e também Molly Parker (interpreta a parteira), embora esta
última com menos protagonismo ao longo do filme e com um papel mais escondido.
"Com um elenco de nomes já conhecidos Pieces of a Woman é um filme que promete dar que falar e que infelizmente parece ter passado ao lado de muitas pessoas." |
Todo o filme tem um ritmo lento e sem grandes ações, sendo
que o maior acontecimento é apresentado logo no início do filme. Somos
introduzidos a Sean, não para percebermos o que fazia da vida ou quem era, mas
sim para entendermos que ele e a mulher esperam uma filha, tudo isto de forma
calma e sem grandes pressas, ao contrário de Sean que é visto como estando
ansioso. Só depois na sua chegada a casa é que temos a grande ação do filme e
que bela sequência que a realização e os atores nos apresentam. São perto de 30
minutos que dão uma sensação de lentidão por todos os movimentos feitos de
forma lenta e pelo sofrimento que é demonstrado, passando por várias fases
diferentes.
É nesta meia hora de filme que vemos toda a sequência do parto e que origina toda a história, um perfeito primeiro ato, sendo que temos a introdução das personagens quase todas e a apresentação do problema. Começamos logo a ver a conversa calma entre Martha e Sean, como se nada se passasse, evoluindo até que estes percebem que é aquele o momento do nascimento, mas a realização não faz nenhum corte temporal, seguindo sempre os dois e criando diálogos entre estes. Vanessa Kirby nesses minutos arrecada logo a nomeação para melhor atriz, desempenhando o papel na sua perfeição, mostrando os vários momentos das contrações, os muitos pensamentos e preocupações das mães, e até mesmo momentos de diálogo sem filtro que levam a falas mais despreocupadas. Até mesmo os enjoos seguidos de arrotos e de uma imagem de vergonha de Martha ao estar assim exposta. A realização ao ter a calma suficiente para não acompanhar todos os movimentos dos protagonistas transmite uma sequência de calma, vagueando pela casa, passando pelas diferentes divisões e não tendo a necessidade de fazer o mesmo caminho que as personagens.
"Vanessa Kirby nesses minutos arrecada logo a nomeação para melhor atriz, desempenhando o papel na sua perfeição (…)" |
É então que no meio desse contraste entre a calma, os gritos
e os nervos vemos o nascimento do bebé, dando-nos uma ideia de que tudo correu
bem e finalmente terminou. Mas para aqueles que já sabiam para o que iam
aquando da escolha do filme, sabiam que algo se iria passar e é aí que a câmara
volta para Martha e a sua filha e temos um momento que passa rapidamente mas
não retira assim o seu drama e o choque. O filme poderia terminar aqui e
ficaria satisfeito com a curta metragem de excelência.
A partir daqui o filme continua com o seu ritmo lento, mas
passando a ter cortes temporais indicados através da mensagem de dias e meses
em que nos encontramos. Esta explicação dos dias a passarem não sei se não
poderia ser evitada, já que as divergências e as discussões, ou mesmo a alteração das
paisagens serviriam para mostrar o avanço dos meses, claro que não saberíamos
que no final já se havia passado um ano desde o parto, mas poderia ser algo
facilmente inserido num dialogo. Em contrapartida essa exposição da data era
sempre com o fundo do avanço das obras da ponte que estava a ser construída
pelo Sean no início do filme e tem sempre o seu sentido de lá estar.
O filme depois do parto não conseguiu agarrar-me novamente
como agarrou nos primeiros 30 minutos, não por se ter perdido ou por ter ficado
mau, mas sim porque é o risco que se corre ao ter um início tao forte que
coloca o espetador em êxtase e quando finalmente abranda a ação, este abranda
com o filme e parece que nada vai superar aquele momento.
"O filme depois do parto não conseguiu agarrar-me novamente como agarrou nos primeiros 30 minutos (...)" |
Outro momento alto de Pieces of a Woman é nos trazido
por Ellen Burstyn, que apesar de durante uma altura nos ser mostrada como alguém
que não está a trazer felicidade à família, e que as suas ações para ajudar
Martha não estão a trazer bem a esta, nos apresenta um monólogo forte e
emocionante capaz de dar outro vigor à sua personagem. Mais um grande momento
desta atriz que já não necessita de apresentação e tem a sua carreira repleta
de atuações fortes e carismáticas.
O filme ao retratar o luto e o sofrimento obriga-nos a ver
uma triste realidade porque muitos pessoas passam, principalmente os pais neste
caso, a falta de apoio psicológico. Pode não estar implícito e não haver nenhum
diálogo em relação a isso, mas todas as ações do filme demonstram isso, e
também a falta de bom senso de muitas pessoas, que não sabem avaliar o que
dizer e quando dizer, magoando ainda mais a outra pessoa, como é o caso da
amiga da mãe de Martha.
Pieces of a Woman é um filme emocionante e com uma mensagem forte de superação e luto. Não vejo Vanessa Kirby com força suficiente para ganhar o prémio de melhor atriz nos Oscars, mas nunca isso iria apagar a sua prestação excelente em que mostrou várias fases de luto e conseguiu representar o seu papel na perfeição.
“There might be a reason for what happened, but we are
not going to find it here in this room. And if I stand here, and ask for
compensation, or money, then I’m saying that I can be compensated, and I can’t.
I can’t bring her back. No money, or verdicts, or sentences can bring back
what… How can I give this pain to someone else? Someone who’s already
suffered?”
João Maravilha
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