Os 5 filmes favoritos do Studio Ghibli (Sem Spoilers)

 


Em Portugal sempre fomos “bombardeados” com a tecnologia e a animação cinematográfica dos mega estúdios norte-americanos, como a Pixar ou a Disney, algo que não permitia que filmes como os do Studio Ghibli chegassem aos nossos grandes ecrãs com a mesma atenção e cobertura que os outros. Posso dizer que “acordei” tarde para a beleza do cinema japonês e que me arrependo de não o ter conhecido mais cedo, mas nem isso me impediu de começar a amar esse cinema de animação e descobrir ainda mais sobre ele, vagueando pelos diferentes estúdios e a descobrir técnicas diferentes e muito positivas.

O Studio Ghibli é um estúdio de animação japonês que foi fundado em 1985 pelo produtor Toshio Suzuki e pelos dois realizadores Isao Takahata e o tão aclamado e quase o rosto principal do estúdio, Hayao Miyazaki. Todos eles já tinham tido sucesso com outros filmes, mas foi após o lançamento de Nausicaä do Vale do Vento que os três se decidiram em criar um estúdio onde pudessem ter a liberdade de escolher o que fazer e com a qualidade que pretendiam, fazendo assim nascer um dos maiores estúdios de cinema de sempre.

Quem vê um filme do Studio Ghibli é praticamente impossível ficar indiferente, e mesmo que a utilização do 2D ou a duração mais estendida dos filmes possam colocar dúvidas no início, após se entusiasmarem com as aventuras dos protagonistas, ou com a beleza e cuidado colocado em cada segmento do filme, a sensação muda totalmente, entrando num estado de romance e adoração para com os filmes.

Já foram vários os filmes criados e lançados pelo Studio Ghibli desde 1985, sendo que O Castelo no Céu (Castle in the Sky) em 1986 abriu todo um novo mundo de animação através da utilização de um mundo futurista, mas que é aproveitado como uma metáfora para as guerras e para a sociedade da época. É comum todos os filmes do estúdio trazerem uma mensagem forte e que se vai adaptando sempre aos novos tempos, nunca ficando datada, como as críticas à guerra, ou ao mundo adulto que se altera e deixa de compreender as crianças, ou à ganância e aos restantes pecados existentes na sociedade. E tudo isto se torna ainda mais maravilhoso quando vemos Hayao Miyazaki afirmar que os seus filmes são dedicados às crianças, mas que apesar disso atingem todas as idades, sendo que a sua experiência pode ir sendo alterada consoante a sua evolução geracional.

Se na Pixar temos temas musicais cantados e que ficam na memória de quem os ouve, então no Ghibli a música é toda ela instrumentalizada de uma maneira em que se interliga com o filme e a história, criando um clima de calma e tranquilidade.

Ao contrário da lista, já anteriormente colocada da Pixar, aqui a nostalgia não terá qualquer impacto, pois como já referi comecei a assistir aos filmes numa fase mais distante da minha infância, no entanto todos os 5 filmes abaixo referidos são para mim um exemplo da perfeição e simplicidade com que os realizadores do estúdio conseguem trabalhar e transmitir.

 

5º Lugar: O Mundo Secreto de Arrietty

 



Arrietty e a sua família são espécies minúsculas que vivem debaixo de uma casa e que a utilizam para sobreviver e arranjar objetos e comida. No entanto Arrietty é descoberta por um rapaz humano e a sua vida de anonimato muda.

 

Este filme de Hiromasa Yonebayashi foi lançado em 2010 e apesar da sua beleza e uma história calorosa parece ter passado ao lado de muita gente. O Mundo Secreto de Arrietty é um filme lindíssimo com uma história de amizade e aceitação aconchegadora, sabendo tratar todos os momentos com delicadeza e trazer tudo numa animação lisa e magnífica.

Somos introduzidos a uma família minúscula em tamanho, mas que tem a sua própria maneira de viver, defendendo-se dos predadores e recolhendo o necessário para subsistir através de engenhos por eles criados. Mas não é apenas a Arrietty que somos apresentados, sendo que a história não se limita ao mundo minúsculo da protagonista, e rapidamente nos mostram um rapaz frágil e adoentado chamado Shô que se mostra com uma opinião diferente em relação às criaturas minúsculas de quem lá em casa falavam e acreditavam. Toda a relação dos dois é desenvolvida com uma calma cuidadosa, sem que existam pressas nem descuidos na construção das personagens.

Se já pela sinopse havia ficado interessado no filme, acho que foi o momento em que Arrietty vai com o pai em busca de novos mantimentos que me agarrei de uma maneira incessante a todo o espetáculo de cores, movimentos e sons que estava a ver e ouvir. Todas as invenções e mecanismos criados para conseguirem ter acesso à casa, mas sempre com um cuidado da realização com as luzes, sabendo que não poderiam iluminar em demasia o interior das paredes por onde as personagens passavam, mas ao mesmo tempo dando-lhes a lamparina era suficiente para o espetador conseguir ver.

O Mundo Secreto de Arrietty é um filme que apesar, de na minha opinião, ser um filme subvalorizado tem uma qualidade imensa e que talvez seja dos filmes dos Studio Ghibli, a par com Ponyo, seja mais semelhante com a temática dos filmes ocidentais.

 

4º Lugar: O Túmulo dos Pirilampos 

 



No final da Segunda Guerra Mundial o Japão era bombardeado constantemente, sendo que tornaram bastantes crianças órfãs. Foi o caso de Seita, de 14 anos, e a sua irmã mais nova, Setsuko, que viram a sua mãe morrer durante um ataque aéreo em Kobe. Ambos tiveram de aprender a viver sozinhos numa gruta que servia de abrigo contra os bombardeamentos, sendo necessária a sobrevivência e a procura de uma nova forma de viver.

 

O filme mais pesado de todo o estúdio, sendo capaz de fazer verter lágrimas a qualquer um. Como já referi na crítica individual do filme, é verdade que a maioria dos filmes de guerra são sobrevalorizados e facilmente idolatrados, mas neste caso fez-se para que tudo fosse diferente. Isao Takahata consegue criar todo um novo conceito de guerra e mudar a lente para o outro lado da Guerra, fugindo ao clássico lado dos Aliados e mostrando os civis que sofreram com os bombardeamentos e mais sofreram no lado do Eixo.

Apesar de ser um filme de animação não houve medo em mostrar o horror e terror da guerra, tendo vários momentos chocantes e avassaladores emocionalmente. Mas se há toda essa imagem sanguinária, a forma como essa contrasta com os momentos de alegria são cuidadosamente colocados, criando uma ligação com os dois irmãos. A ternura e o amor vivenciados pelos dois e de um irmão capaz de mover mundos e fundos apenas para ver a sua irmã mais nova não sofrer são incríveis, fazendo com que o amor entre eles seja mostrado e sofrido pelo espetador também, mesmo que muitas vezes possamos ficar angustiados e revoltados com certas escolhas dos protagonistas.

É verdade que a animação não é a melhor e está bem datada, mas em todo o filme isso é o menos importante. Assim que começamos a ver o desenrolar do enredo esquecemos qualquer pormenor da animação e apenas esperamos que tudo o que acreditamos ter visto no início seja mentira e não aconteça.

Se há filme que para mim exemplifica bem a seriedade e frontalidade do Studio Ghibli é o Túmulo dos Pirilampos, pois nunca noutro estúdio de animação seriamos capaz de ver um tema tão pesado ser mostrado de uma forma tão crua e verdadeira, sem que exista um embelezamento para não chocar.

 

3º Lugar: A Viagem de Cihiro (Spirited Away)

 



Numa viagem com os seus pais, Chihiro, vê-se presa num mundo de deuses, e criaturas místicas de onde terá de arranjar forma de se libertar a si e aos seus pais.

 

O filme mais conhecido e mais aclamado do Studio Ghibli. Considerado por muitos o melhor filme de animação deste século e não se está a exagerar, pois só para termos a noção, foi o único filme falado noutro idioma que não o inglês a conseguir vencer o Óscar de Melhor Filme de Animação até à data. Mas nem era necessário o prémio, pois o que não falta no mundo dos prémios de cinema são injustiças. O filme escrito e realizado por Hayao Miyazaki é uma obra prima de um nível estrondoso, que consegue maravilhar em tudo: música, animação, história, personagens e até é o maior exemplo da arte de poder colocar momentos parados onde nós, espetadores, nos perdemos na beleza do momento e da paisagem, mostrando que não é necessário cobrir todo o filme de falas e ações entusiasmantes para o tornar interessante, criando a beleza através da calma. Vejamos a sequência do comboio e toda a beleza carregada nela.

Chihiro é também um exemplo de uma das maiores conquistas e temas do Ghibli: a mulher independente que consegue sobreviver e superar os seus obstáculos sozinha. Se no Ocidente só recentemente tivemos heroínas no cinema de animação, no Japão e no Studio Ghibli, essa ideia já é velha, sendo que a mulher para além de ser protagonista é também independente, não necessitando de um herói, mas sim de amigos.

A beleza de cada momento agarrou-me intensamente na primeira vez que vi o filme e desde aí que sempre que revejo maravilho-me ainda mais. Como é que algo tão belo consegue ser feito e ainda acrescentar várias críticas à sociedade. É um filme feito para crianças, mas onde são os adultos que mais se identificam com os problemas e pecados cometidos.

A Viagem de Chihiro é sem dúvida um dos melhores filmes de animação de sempre e um ponto de partida para aqueles que se querem aventurar no mundo cinematográfico de animação japonesa, ficando logo a imagem de beleza e realidade.

 

2º Lugar: O Castelo Andante (Howl’s Moving Castle)

 



Sophie é uma mulher tímida e sem confiança que foi amaldiçoada com o envelhecimento e que para se livrar da maldição tem de auxiliar Hauru, um feiticeiro condescendente e inseguro que controla um castelo andante.

 

Foi este o filme que me fez iniciar uma maratona pela maioria e mais aclamados filmes do Studio Ghibli. Com uma animação semelhante ao filme listado no terceiro lugar desta lista, Hayao Miyazaki consegue fazer algo grandioso e diria até algo que se excede nas expetativas. Miyazaki agarrou numa história e transferiu para o cinema de animação de uma forma excelente, sendo capaz de construir todo um mundo novo e fantástico que muitos poderiam duvidar ser impossível de fazer.

A história de amor entre Sophie e Hauru é belíssima e bastante identificável com muitas pessoas. Hauru como uma personagem convencida e poderosa, mas que não tem confiança nele próprio e para esconder essa imagem se finge atrás da irresponsabilidade e condescendência, enquanto que Sophie que era uma rapariga tímida e nada confiante tem de se transformar em alguém capaz e segura de si, sabendo chamar à razão os outros.

No entanto O Castelo Andante não é apenas um romance, sendo que também aqui Miyazaki coloca o tema da guerra e as duras metáforas sobre esta. É um filme que ao ter vários momentos e diferentes cenários poderia ser complicado de interpretar, no entanto toda a estrutura dele é feita de forma a que a história se desenrole com base na evolução das personagens sem que se torne monótono ou confuso. A experiência e técnica do realizador japonês criaram algo fácil de ser visto por qualquer espetador mesmo tendo um argumento complexo e variado.

O Castelo Andante é um filme completo e com uma história de amor belíssima, fugindo aos clichés e aos momentos melosos. É um filme obrigatório para qualquer amante de cinema e de animação que com certeza ficará maravilhado e descobrirá um novo interesse.

 

1º Lugar: Princesa Mononoke  

 



Ashitaka é um príncipe que se vê amaldiçoado por um javali possuído e que para encontrar a cura tem de partir numa viagem. É então que se cruza com Sam, uma rapariga que vive com os lobos e tem como missão proteger a floresta e todos os seres que lá vivem, e ainda com a Lady Eboshi, que tem como objetivo destruir a floresta. Ashitaka tem assim de arranjar uma solução para o conflito e ainda uma cura para a sua maldição.

 

É então que a lista chega finalmente ao seu topo e posso dizer que foi difícil escolher as diferentes posições do pódio, mas depois de analisar cada um mais cuidadosamente percebi que a Princesa Mononoke se coloca um pouco mais acima por toda a sua temática. Novamente um filme de Miyazaki em que este coloca toda a sua arte e inteligência em favor da longa metragem. Um filme desenhado principalmente para as crianças, mas que quando visto por alguém mais velho é então que as mensagens lá colocadas são expostas e torna-se todo num novo mundo.

A temática de guerra entre a natureza e a humanidade, ao mesmo tempo que assistimos à relação de Sam com Ashitaka é toda elaborada com o cuidado necessário, sabendo controlar os diferentes ritmos do filme e das emoções, variando entre os momentos de raiva e ódio sentidos pela Sam e pela Lady Eboshi, e os de amor e compaixão. Rapidamente as mensagens poderiam ser perdidas através da mitologia inserida ou pelas criações mais fantasiosas, mas pelo contrário, isso só traz ainda mais magia e uma visão diferente ao espetador, entrando naquele mundo de criaturas endeusadas que convivem com os humanos e ao mesmo tempo nos faz andar num limbo entre a realidade da natureza e a da mitologia.

 A guerra e o não respeito da natureza por parte do Homem são a meu ver as duas maiores críticas de Miyazaki durante o filme e que faz de uma maneira eximia, não tendo medo de o mostrar e de agarrar em imagens mais fortes. É claro que depois de percebermos a crença do realizador e a forma como este vê a natureza como algo divino percebemos melhor a questão das diferentes criaturas que vão aparecendo, mas é apenas algo que vai complementar, pois o filme faz-se valer por ele próprio, sendo capaz de agarrar e maravilhar qualquer espetador.

A Princesa Mononoke é uma das maiores obras de arte do cinema de animação e em geral, pois consegue pegar em todas as gerações de espetadores e fazer com que cada um se agarre a uma forma observar e amar o filme, sendo muito difícil criticar negativamente.

 

São estes os meus 5 filmes favoritos do Studio Ghibli e na minha humilde opinião são longas metragens obrigatórias de ver para todos aqueles que têm no cinema de animação uma paixão e uma diversão. Prometo que não terão tempo desperdiçado e que iremos aprender sempre algo novo com cada filme que vemos, e o Studio Ghibli é especialista em fazer filmes com mensagens emocionantes e educativas.

 

João Maravilha

Comentários

Críticas Populares