Tudo Pelo Vosso Bem (I Care A Lot) (2020)

            



            Marla Grayson é uma tutora legal que descobre uma maneira de se tornar rica e poderosa através da tutela dos idosos. Mas é quando esta descobre a sua cliente perfeita que se coloca em perigo e tem de fazer escolhas para sobreviver.

 

             Tudo Pelo Vosso Bem é um filme realizado e escrito por J Blakeson, que já havia realizado a 5ª Vaga e o The Disappearance of Alice Creed. Não é o realizador mais famoso nem tem um currículo espetacular no que a longas diz respeito, sendo que a 5ª Vaga arrecadou algumas críticas negativas. Em Tudo Pelo Vosso Bem, Blakeson parece ter uma ideia sobre um drama e com uma crítica à sociedade muito boa, mas que não sabe o que mais pode tirar dali, criando personagens e uma nova trama que mistura a história e lhe dá outro rumo. Penso que ainda não foi desta que o realizador acertou com o seu modelo de escrita e realização, deixando momentos no filme que podiam muito bem ser apagados e ter seguido outro rumo para a história. I Care a Lot é um filme das produtoras Black Bear Pictures e Crimple Beck.

            O filme conta com um elenco muito experiente e já famoso. Fazem parte dele Rosamund Pike, Peter Dinklage, Eiza Gonzaléz e também Dianne Wiest. A primeira já havia feito um grande papel em Em Parte Incerta (Gone Girl), demonstrando a sua aptidão para papéis de vilã em que é odiada. Já Peter Dinklage, pelo seu papel na série Guerra dos Tronos (Game of Thrones), deu um salto para a fama. Mas é com a personagem deste último que fiquei desapontado e não apreciei mais I Care a Lot. Não pelo ator, porque Dinklage apresenta-se lindamente e consegue entregar o que eu considero que foi pedido, mas, sim, porque a personagem é vazia e é apenas mais uma mafiosa num filme americano. É um cliché tão grande que já está demasiado gasto, sendo que na maioria das vezes aparecem em filmes de ação e neste caso nem isso é.


"O filme conta com um elenco muito experiente e já famoso."


            Mas comecemos pelo que de bom tem o filme. Rosamund Pike mais uma vez na entrega de um papel de uma mulher independente e bastante poderosa emotivamente. Depois de em Gone Girl ter representado uma vilã que faz qualquer espetador ficar impaciente e com raiva da personagem, em I Care a Lot também representa uma protagonista, mas sem que seja, de longe, a boa da fita. Marla é capaz de tudo para atingir os seus fins, e isso está logo presente desde o início, onde esta, no tribunal, não cede aos pedidos do filho que apenas quer ver a sua mãe no lar e que se encontra sobre a tutela de Marla. Também nessa cena nos são expostos todos os detalhes de Marla, mostrando o cabelo arranjado de maneira perfeita e o cuidado que esta tem com a perfeição e o posicionamento das coisas que a rodeiam, não deixando nada ao acaso e tendo a necessidade de controlar tudo.


"Rosamund Pike mais uma vez na entrega de um papel de uma mulher independente e bastante poderosa emotivamente."


            Quando começamos a ver o primeiro ato do filme, esperamos algo que acaba por não aparecer. Vemos uma Marla sedenta por dinheiro e sucesso, tendo até as imagens do sadismo dela a não se importar de ver os idosos a serem colocados nos lares sem o aval destes. Quando a personagem de Dianne Wiest é retirada à força de casa e colocada no lar, sem que nada lhe seja explicado, vemos um complô de interesses que passava pelo dono do lar, a médica e, claro, por Marla. Na minha opinião, era neste tema que o filme se deveria ter focado, na questão dos interesses e da forma de enriquecimento dos tutores, criando aí um drama de maior interesse e não sendo necessário colocar a máfia ao barulho. Neste primeiro ato, o filme procura ser algo que não o é, um filme com uma crítica social que se centra no sadismo de Marla, não se interessando com a alegria dos seus clientes, querendo apenas retirar deles o seu dinheiro. Também na sequência da venda da casa e dos bens, com uma música acelerada, vemos Marla e a sua assistente, Fran, sem qualquer receio de vender nem lucrar e não mostrando qualquer interesse pela opinião da Jennifer Peterson (personagem de Dianne Wiest), que já se encontra no lar contra a sua vontade.


"Neste primeiro ato, o filme procura ser algo que não o é, um filme com uma crítica social que se centra no sadismo de Marla (…)"


            Se tudo até aqui estava a agradar, é então que a personagem de Peter Dinklage é introduzida, e a bola de neve dos maus acontecimentos vai rebolando para destruir aquilo que tinha enquanto expectativa do filme. Como supracitado, o envolvimento da máfia russa nos filmes é um assunto já muito usado no cinema ocidental como forma de desempenhar vilões e criar uma trama. Neste caso, a ideia não trouxe nenhum resultado positivo. Transformaram um filme que tinha tudo para dar um bom drama numa mixórdia de géneros, passando também pela comédia, pelo thriller e pelo crime. A questão da máfia vem trazer um elemento surpresa que em nada era pedido. Arranjaram uma maneira mais fácil de mostrar que Marla é uma mulher forte e poderosa, mas ao mesmo tempo deram-lhe um protagonismo que parece servir para tentarmos esquecer a sua malvadez. Ao inserirem Roman (personagem de Dinklage), acabaram por tirar personagens como Fran (interpretada por Eiza González) ou Jennifer, que vinham a ser bastante importantes para a história. Compreendo o que tentaram fazer ao inserir vários géneros de filme ou ao introduzirem a personagem do Roman, no entanto, para mim, não funcionou. Tornou tudo numa algazarra, e ao darem uma expectativa de tema na primeira hora e depois largarem-no tornou tudo pior, fazendo com que o espectador se sinta perdido.


"(…) é então que a personagem de Peter Dinklage é introduzida, e a bola de neve dos maus acontecimentos vai rebolando para destruir aquilo que tinha enquanto expectativa do filme."


            A personagem de Marla está construída de uma maneira interessante e Rosamund Pike dá um tom ainda melhor. A forma como ela é apresentada no início, destemida e decidida na procura do maior lucro, serve também para que, mais tarde, não estranhemos as suas decisões alienadas do medo. Na altura de ameaças sabemos que a Marla não se vai deixar ficar e largar o dinheiro em prol do medo, afastando, assim, qualquer dúvida sobre o seu caráter. No entanto, a decisão no final é demasiado dúbia, mas visto que o comportamento da personagem foi feito à volta daquela decisão, até pode ser aceite. 


"A forma como ela é apresentada no início, destemida e decidida na procura do maior lucro, serve também para que, mais tarde, não estranhemos as suas decisões alienadas do medo."


            Tudo Pelo Vosso Bem é um filme que tinha tudo para ser muito bom, mas perde-se pelo caminho com decisões cliché e que fazem perder o interesse, porém, a atuação de Rosamund Pike é excelente e demonstra mais uma vez que é talhada para estes papeis.

         

“There are two types of people in this world. Those that take and those that get took. Lions and lambs. My name is Marla Grayson and I am no lamb. I'm a fucking lioness.”

João Maravilha

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