Promising Young Woman (Uma Miúda com Potencial) (2020)

 

Uma jovem mulher que vive sedenta de vingança da morte e violação da sua amiga, decide, ela mesmo, começar a assustar predadores sexuais e a fazer com que estes sofram pelos seus atos.

 

Promising Young Woman é um filme que na sua maioria é muito bem conseguido, sendo capaz de tocar num ponto sensível e tão importante como o assédio e violação e tornar num drama em que mostra a força da mulher e a coragem que esta tem para enfrentar a vida. O filme é escrito e realizado por Emerald Fernnell que se estreou na realização de longas-metragens e não podia pedir melhor, tornando-se a primeira mulher a ser nomeada para Melhor Realização nos Óscares com o seu filme de estreia. É de realçar que Emerald Fernnell foi a imagem da força da mulher pois durante todo o período de gravações e de produção do filme esta encontrava-se grávida, dando à luz três semanas após a conclusão da produção. A grande estrela do filme é Carey Mulligan, interpretando Cassandra, que novamente mostrou ser uma excelente atriz e que com certeza iremos ver ainda mais nos grandes ecrãs.

O filme começa logo com um toque de suspense e desconfiança, quando Cassandra está sentada no bar fingindo estar bêbada enquanto é abordada por um homem que parece estar a ser simpático, mas as suas intenções quando a leva para casa comprovam que não é bem assim. É logo um início forte a mostrar para o que Cassandra está pronta para vingar todas as mulheres que sofreram violações e assédios, deixando até no ar a incógnita do que esta fez com o homem, pois vemos um escorrer de um líquido vermelho pelo braço dela enquanto caminha pela rua, mas que depois se comprova ser ketchup do cachorro que estava a comer, separando assim o filme do terror. É também nesta sequência que se faz a crítica aos piropos e se demonstra que muitas vezes quem o faz são pessoas fracas que assim que são confrontadas se encolhem e perdem toda a coragem e masculinidade que queriam mostrar.

Promising Young Woman não se limita a mostrar uma vingança sobre os predadores sexuais, mas também apresenta uma crítica enorme há proteção que existe sobre estes por parte da grande maioria da população. Não pretendem esconder o erro da culpabilização da vítima por parte de todos, quer seja homem, quer seja mulher, sendo que é um assunto importantíssimo e que ainda hoje se vê em qualquer lado. A vítima é quem mais sofreu e mesmo assim tentam fazer com que esta sofra ainda mais ou que lhe imponham regras sobre como se vestir ou comportar, quando é no predador que se encontra toda a culpa e ação criminosa. É nojento que numa sociedade que se diz evoluída e cheia de liberdade, ainda exista quem defenda que a culpa é da vítima, porque esta e passo a citar muitas dessas pessoas que culpam quem sofreu: “Veste-se assim é porque está mesmo a pedi-las”. É contra este pensamento que o filme se mostra totalmente contra e tem coragem de não se esconder ou tornar menos agressivo. É claro que também existe um sentimento de generalização e ódio, mas serve para dar a imagem do que uma mulher sente.

Mas voltando novamente à história. Cassandra é sempre a imagem da vingança e ao mesmo tempo que se mostra forte e impõe medo aos predadores sexuais, mostra momentos de fraqueza e medo por se lembrar do que aconteceu à sua amiga. É esse mesmo medo que a afasta inicialmente do relacionamento com Ryan. E é nesta personagem que fiquei um pouco com o pé atrás com o filme e achei que houve uma ou outra falha para que tudo se encaixasse, mesmo que criasse questões mais estranhas. Ryan ama Cassandra e comprovou isso, mesmo depois de ter errado numa abordagem à qual ela acaba por desculpar. No entanto quando esta a confronta com uma questão passada ele parece não se interessar pelo bem dela, servindo para mostrar que todos os homens são maus e embora se mostrem inocentes, irão acabar por cometer sempre algo erro grave.

Cassandra tem como objetivo de vida vingar a morte da sua amiga e castigar aqueles que a violaram e mataram, mas também todos aqueles que se calaram e defender o agressor, e para tal vemo-la a engendrar todo o tipo de planos para conseguir castigar. Enquanto estava a ver o filme e via o que Cassandra ia fazendo, principalmente quando esta falava no restaurante com uma das suas antigas colegas, dei por mim a pensar que o que esta fazia para vingar a sua colega também não era o mais digno, no entanto assim como na cena inicial do cachorro-quente em que confundimos com sangue, também aqui temos a impressão de que algo ela poderá fazer algo de mal, sendo que depois sabemos que esta nunca parte por uma vertente violenta e consegue “acordar” as pessoas.

O terceiro ato do filme, na minha opinião, tem altos e baixos. Ora conseguiu criar um clima de suspense e quase terror como depois acelerou e quase que criou um momento parvo, fazendo com que tudo terminasse abruptamente. A longa conversa final é um momento forte, onde Emerald Fernnell consegue criar um momento de suspense inspirado em vários filmes do mesmo género e melhorar, no entanto, depois desse momento tudo parece passar a acelerar, perdendo o interesse, mesmo que depois mesmo no final consiga voltar a reerguer a atenção.

Promising Young Woman estava nomeado para 5 Óscares 2021, sendo que o filme de Emerald Fernnell venceu apenas o prémio de Melhor Argumento Original. É um filme com uma mensagem fortíssima e que relata a triste realidade das mulheres, que infelizmente ainda não podem andam seguras e vestirem ou fazerem o que querem. Todo o filme é uma crítica ao sentimento de impunidade que existe a favor do violador/predador sexual e à culpabilização da vítima.

Na sua totalidade está um filme muito bom em que poderia ser melhorado com um toque diferente em certas partes, mas que nem isso o destrói e comprova que está muito bem conseguido. Uma palavra para a trilha sonora que está muito boa e se não está perfeita, anda lá mesmo muito perto.

“Can you guess what every woman's worst nightmare is?”

João Maravilha