Mank (2020)

 


Uma observação de Hollywood dos anos 30 através dos olhos do critico e argumentista de cinema Herman J. Mankiewicz, enquanto este escreve o argumento para Citizen Kane.

 

Mank, assim como o Citizen Kane, foi rejeitado por algumas produtoras e a sua produção foi sendo adiada desde 1990, altura em que Jack Fincher, pai de David Fincher, escreveu o roteiro. No entanto, a Netflix apostou em David Fincher e, apesar de não podermos ver este filme nos grandes ecrãs, sempre nos podemos encantar com mais um excelente filme do realizador já por duas vezes nomeado ao Oscar de Melhor Realizador, e também com a grande história e beleza da representação de Hollywood dos anos 30. Pode não ser um thriller ou um filme com um roteiro cheio de reviravoltas como o Fight Club ou Gone Girl, mas é uma grande obra de David Fincher, com um toque sensível e a voltar a demonstrar que para além de ser um excelente realizador, é também um excelente contador de histórias.

"(…) uma grande obra de David Fincher, com um toque sensível e a voltar a demonstrar que para além de ser um excelente realizador, é também um excelente contador de histórias."


Mankiewicz, interpretado por Gary Oldman, tem de escrever um guião para Citizen Kane, a pedido de um jovem realizador chamado Orson Wells (Tom Burke), no prazo de 60 dias, enquanto recupera das lesões provocadas por um acidente de carro. É durante este processo que temos acesso às visões de Mank, que relembra o seu passado no cinema e toda a vida em redor para se inspirar para aquela que viria a ser considerada uma das maiores obras-primas do cinema. O filme, de forma hábil e inteligente, não se foca no processo da escrita, mas sim nas memórias de Mank, utilizando estas para que nós, os espetadores, sejamos conduzidos para a época, criando, assim, uma experiência imersiva através de uma narração da história.

Enquanto vemos o processo de escrita de um dos maiores filmes alguma vez feitos, temos também visões e exemplos de como era o mundo do cinema dos anos 30. Estas visões são nos dadas através de flashbacks da vida do escritor, onde temos várias viagens pelo tempo, que nos demonstram o glamour, a boémia, os problemas, as incertezas e as relações dos participantes deste mundo. Toda a realização do filme nos envolve nessas ocasiões, levando o espetador a um cinema da época, com cores monocromáticas e uma composição musical, de Trent Reznor e Atticus Ross, perfeita para as situações.

"Estas visões são nos dadas através de flashbacks da vida do escritor (…) que nos demonstram o glamour, a boémia, os problemas, as incertezas e as relações dos participantes deste mundo."


 Os problemas da escrita do guião, os prazos de entrega, a crítica dos produtores e o medo de o público não entender a história estão sempre presentes na hora de realizar um filme, e Mank traz todos esses problemas para o espetador. Um mundo que, muitas vezes, é visto como um paraíso e cheio de alegria, é também composto por tristezas e interesses, algo que é bastante destacado neste filme através das memórias dos bastidores. A crítica aos interesses políticos que Hollywood possui e altera, a demonstração da venda dos ideais em favor de emprego, as ilusões e os fingimentos das relações são temas que Mank consegue abordar sem necessitar de um grande esforço, tornando a história fluida e exemplificativa.

Mank, mais que uma biografia, é uma imagem de Hollywood dos anos 30, mostrando a vida bela de um sucesso efémero, cheio de amizades e interesses, também eles passageiros.

“Chega para me convencer de que um argumentista é uma ameaça maior para um público incauto do que um lacaio.”

 

                                                                                                                João Maravilha

 

 

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